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A cada hora, quatro crianças ou adolescentes são vítimas de violência sexual no Brasil, e menos de 10% dos casos chegam a ser denunciados. Os dados, divulgados pela Childhood Brasil, revelam um cenário em que o silêncio ainda prevalece — e reforçam a urgência de criar espaços seguros de escuta como parte fundamental da proteção à infância.
É nesse contexto que a psicóloga e educadora Vanessa Miranda lança o livro Contos Fora da Cachola, uma obra interativa que transforma a escuta ativa em prática concreta de cuidado, vínculo e prevenção. Mais do que um livro infantil, a proposta é oferecer uma ferramenta que ajude crianças a expressarem sentimentos com segurança e permita que adultos aprendam a escutar de forma mais atenta e sensível.
“Quando olho para uma sala com 20 alunos, penso que, estatisticamente, dois ou mais podem estar sofrendo em silêncio. Esses números deixam de ser abstratos e passam a ter rostos conhecidos”, afirma Vanessa. “Como mãe de duas crianças, senti que não podia ignorar essa realidade. Precisava criar um espaço seguro para que meus filhos — e outras crianças — pudessem falar sobre o que sentem e, se necessário, pedir ajuda.”
Transformar histórias em conversas reais
No cotidiano, muitas conversas entre adultos e crianças se limitam a perguntas automáticas, como “como foi o dia?”, seguidas de respostas rápidas e superficiais. Falar de emoções, no entanto, exige tempo, presença e um ambiente de confiança — algo que nem sempre encontra espaço na rotina.
Contos Fora da Cachola nasce justamente para criar esse tempo e esse espaço, usando o brincar como principal linguagem de comunicação. O livro foi desenvolvido para apoiar pais, educadores e profissionais da saúde e da assistência social na prática da escuta ativa, respeitando o ritmo e os limites de cada criança.
“Perguntas diretas raramente funcionam”, explica Vanessa. “A criança precisa do lúdico, da possibilidade de escolher sobre o que quer falar e de um adulto que esteja realmente disposto a escutar.”
Como o livro funciona, na prática
Pensado como uma ferramenta participativa de diálogo, Contos Fora da Cachola reúne diferentes recursos lúdicos que estimulam a expressão emocional. O material inclui quadrinhos para a criança desenhar e construir suas próprias histórias, personagens de papel personalizáveis com adesivos de expressões, roupas e acessórios, além de um teatro de papel que permite encenar as narrativas criadas.
As atividades propostas estimulam a conversa sobre diferentes situações e emoções de forma leve, sempre respeitando o tempo da criança. Ao criar e brincar, ela fala de si sem precisar se expor diretamente — é a história que fala, não a criança, o que torna a expressão mais segura e acessível.
Escuta ativa como forma de proteção
Ao longo das brincadeiras e narrativas, o livro favorece a expressão verbal, fortalece vínculos e amplia o vocabulário emocional da criança. Para o adulto, a escuta atenta ajuda a perceber mudanças de comportamento e possíveis sinais de vulnerabilidade.
“O livro não investiga nem força relatos”, reforça Vanessa. “Ele cria um ambiente em que a criança pode falar, ou não. Ter essa escolha é parte fundamental da segurança.”
Em um cenário em que o medo, a vergonha e a ausência de adultos disponíveis mantêm muitas crianças em silêncio, escutar deixa de ser apenas um gesto educativo e passa a ser uma oportunidade real de proteção.
Impacto social e convite à participação
Além do uso em famílias, escolas, hospitais e serviços de assistência social, o projeto também possui uma frente de impacto social. Por meio da modalidade de compra para doação, exemplares do livro são enviados diretamente a instituições reconhecidas pelo trabalho que realizam na proteção da infância, como Maringá da Paz, Lar Escola e APMIF São Rafael.
Em um contexto em que o silêncio ainda protege a violência, Contos Fora da Cachola se apresenta como uma ação concreta: transformar escuta em cuidado e histórias em proteção.
O livro está disponível para compra e para doação de exemplares a instituições pelo site oficial.





